Popularizado na Europa como o Século das Luzes, para a História do Brasil, o século XVIII (anos setecentos) é o século da escuridão, pois muito pouco se sabe sobre este período. Escrito por Nícolas Basílio para Wikipédia, este artigo foi impugnado pelos guardiães daquela entidade que, em 19.02.2009, o tiraram do ar, deletando-o. Em sua luta em prol da inclusão do negro na historiografia e no ensino de 1º e 2º graus, o MGQUILOMBO dá apoio ao autor, Nícolas Basílio, e o desagrava publicando o seu excelente texto.
Século XVIII – O Século da Escuridão para a História do Brasil
Popularizado na Europa como o Século das Luzes, para a História do Brasil, o século XVIII (anos setecentos) é o século da escuridão, pois muito pouco se sabe sobre este período.
O que Sabemos do Século XVIII Brasileiro
Falando apenas do Sudeste, a historiografia brasileira aborda apenas a descoberta do ouro (1695), a Guerra dos Emboabas (1709), as Revoltas de Vila Rica (1718-1720) e a Inconfidência Mineira (1788-1792). O período de 1720 a 1788, 68 anos, tem sido uma total escuridão em nossa historiografia.
Alguma Luz à Historiografia Brasileira do Século XVIII
Portugal descobrira o Brasil, mas pouca atenção vinha dando às suas riquezas. Descobertas as minas gerais (sic), as elites políticas e econômicas do reino decidiram tomar o poder político e econômico no Brasil-Colônia, cujos nativos, ao contrário do que dizem muitos historiadores nunca tiveram um status político igual ao dos portugueses reinóis e sempre foram discriminados.
O Embrião do Nativismo Brasileiro
O sentimento nativista nasce, sim, a partir da Guerra dos Emboabas (1709). Resulta da violenta discriminação portuguesa contra os nativos da Terra. Veja-se, por exemplo, que chegando a Minas, o governador “dom Fernando Martins Mascarenhas tirou os postos que estavam dados pelo governador Manoel Nunes Viana (aos reinóis) e os deu a alguns paulistas e a filhos do Rio de Janeiro. Manuel Nunes Viana mandou carta ao senhor dom Fernando dizendo que não era conveniente Sua Senhoria tirar postos dos reinóis e dá-los a paulistas e cariocas”[1].
O que há no Buraco Vazio da História do Brasil – 1720 a 1788
A Guerra dos Emboabas nunca foi APENAS uma briga dos paulistas contra os portugueses. Foi quando, começando o processo político-econômico de tomada de poder na colônia, os grupos de poder do Ultramar iniciaram a desmoralização do poder político e econômico dos potentados da terra, fossem eles de São Paulo, do Rio de Janeiro, da Bahia, do Pernambuco, etc.
Esse conflito não termina, mas apenas começa com a Guerra dos Emboabas. Com o sistema tributário da capitação (1735-1751), os reinóis, tornando-se maioria em Minas Gerais, impuseram violento expansionismo, abocanhando territórios a norte, a sul e a sudoeste, extinguindo politicamente a Capitania de São Paulo (1748-1763/5). Em 1755, em todo o Brasil, foram outorgados ao índio todos os direitos de cidadania e vassalagem, com status de homem branco, podendo chegar até a nobreza, ganhando uma espécie de cota (preferência) nos serviços públicos. Isto, não foi em respeito ao índio que, na verdade, nunca foi beneficiado por isto. Não. Foi para empobrecer o potentado da terra, cuja escravaria era majoritariamente indígena. O potentado lusitano que tinha apenas escravos africanos, ficou muitíssimo mais forte em todo o Brasil. O tráfico de africanos, mais ainda. Enquanto isto, a opressão do tributo da capitação obrigou os brasileiros comuns das Minas e dos Goiases (brancos pobres, caboclos, mulatos e negros forros) a fugirem para os sertões, onde suas vilas foram consideradas quilombos e massacradas a mando de Gomes Freire de Andrade (1746 e 1758-1760).
Em 1750 as Minas já estavam falidas pela Capitação. O futuro marquês de Pombal extinguiu o sistema tributário da capitação e reimplantou os quintos por casas de fundição, culminados com a derrama, no caso do não atingimento das 100 arrobas anuais, com rateamento apenas a quem tivesse patrimônio, isto, só para as Minas Gerais. São Paulo, Goiás e Mato Grosso, falidas, não foram oneradas com a derrama.
Após o extermínio da Confederação Quilombola do Campo Grande, os reinóis tomam definitivamente o poder nas Minas Gerais e na colônia brasileira. A Capitania de São Paulo renasce das cinzas em 1763-5 (sic) após a morte de Gomes Freire de Andrade. Porém, renasce majoritariamente reinol. A partir daí, os brasileiros, mais que nunca, são discriminados.
Veja-se, por exemplo, o caso da carreira militar de Tiradentes, cuja mãe era paulista. Desde quando se criaram os Dragões, em carta de 24 de julho de 1711 (renovada inúmeras vezes), o rei estabeleceu que “nunca promovesse a oficiais delas aos paulistas, por serem homens suspeitosos”[2].
A própria descida da capital da colônia brasileira, de Salvador para o Rio de Janeiro, significou a vitória total da tomada de poder do grupo reinol liderado no reino, inicialmente, pelo confessor e pelo secretário do Rei Dom João V, Dom Gaspar e Alexandre de Gusmão e, ao final (reinado de Dom José), apenas pelo marquês de Pombal. Gomes Freire de Andrade perpassou, participou e praticou todas as articulações, intrigas, perseguições e genocídios com que fustigou o Brasil e os brasileiros do Sul e Sudeste no período de 1733 a 1763, quando morreu como covarde, acusado também de apropriação indébita de dinheiro público, sem conseguir ser o vice-rei do Brasil.
É a partir dos anos de 1788 que se iniciam as primeiras confabulações que culminariam na Inconfidência Mineira, onde, um dos inconfidentes, coronel Francisco de Paula Freire de Andrade, era sobrinho bastardo do genocida Gomes Freire.
As Luzes da História ainda Estão nos Arquivos do Brasil
Veja-se, pois, que o Século XVIII, não só nas Minas Gerais, mas em toda a historiografia brasileira, vinha sendo mesmo o Século da escuridão, demonstra o pesquisador de história, Tarcísio José Martins, em seu livro, documentado com expressiva fonte manuscrita (2.744 notas de rodapé)[3].
Por outro lado, muito precisa ser estudado na documentação manuscrita para que a historiografia do Século XVIII receba importantes luzes também dos demais Estados brasileiros, visto que o Brasil é muitíssimo maior do que o seu Sudeste.
Confira a OUTRA matéria de Nícolas Basílio que também foi escorraçada pelos guardiões da Wikipédia. Preconceito?
Trata-se da matéria “Gomes Freire de Andrade, 1º Conde de Bobadela – A Visão dos Vencidos”, aqui reformulada para “Gomes Freire de Andrade, 1º Conde de Bobadela – O Outro Lado de Gomes Freire“.
[1] Anônimo, Vila Rica, 1750, in Códice Costa Matoso, v. 1, p. 199.[2] Instrucção, item 13 do parágrafo
2º do capítulo 9º e item 2 do capítulo 25, Revista do Archivo Público Mineiro, 1903, v.8, Fasc. I e II, p. 457 e 559.
[3] Quilombo do Campo Grande – A História de Minas que se Devolve ao Povo, MG QUILOMBO Editora, 1032 páginas, São Paulo/SP – ago-2018.